Decorria o ano de 1985 e a região jaguaribana enfrentava uma das maiores enchentes de sua história. O Jaguaribe, “o maior rio seco do mundo”, contrariando seu cognome, invadia, com suas águas, as cidades ribeirinhas que culminou com a falta de alimentos.
No Palácio da Abolição, o governador Gonzaga Mota se desesperava com os pedidos alarmantes de S.O.S. diante da falta de recursos para enfrentar a fome que se alastrava naquela área do sertão do Ceará. O telefone não parava de tocar na antissala do chefe do Poder Executivo. A maioria das ligações era de prefeitos desalentados com o povo faminto. O chefe de gabinete Vladimir Spinelli, num vaivém crucial — telefone-governador-telefone — era quem transmitia as lamúrias vindas de inúmeros municípios do vale do Jaguaribe. Um dos telefonemas mais angustiantes foi o do prefeito de Jaguaruana ao relatar, aflito, a situação calamitosa de seus munícipes, informando, por conta do desespero, que iria permanecer na linha, no aguardo de uma solução.
Concomitante, toca o “telefone vermelho” do governador, privativo dos assessores mais diretos. Era o secretário da Fazenda Firmo de Castro para informar que no posto de fiscalização de Penaforte, divisa com o Estado de Pernambuco, acabara de chegar uma carreta transportando uma alentada carga de ovos, doação de uma empresa do sul do país. O governador “criou alma nova” e, com um brilho nos olhos, tirou os óculos e falou alto e bom som:
— Vladimir, pergunta ao prefeito se aceita ovos?
É claro que a resposta foi positiva e a valiosa (e pesada) carga chegou, no dia seguinte, ao seu destino.
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Agora, já estamos no ano de 1990. O ex-governador Gonzaga Mota, candidato a deputado federal, visita Jaguaruana em campanha eleitoral. Eu, que no governo “do bem-estar social” fora seu assessor especial de Cultura e Desporto, estava ali, no palanque, como mestre de cerimônias, conduzindo a palavra dos oradores que enalteciam a administração do “governador dos pobres e dos humildes”, refrão que se espalhou pelo Ceará afora. Era uma manhã de sábado, com um grande número de pessoas que se acotovelavam na praça principal da cidade.
No palanque, entre um discurso e outro, fui solicitado pelo mesmo cidadão que fora prefeito na época das enchentes para que eu anunciasse a palavra de uma “mulher do povo” que gostaria de fazer um agradecimento de coração. Abri espaço, e ela, trazendo ao colo uma criancinha, assim se expressou ao microfone:
— Povo de Jaguaruana! Todos devem saber que esta menina é minha filha. Ela nasceu depois daquela enchente. Cresceu forte e com muita saúde. E tudo isto eu devo aos seus ovos, governador Gonzaga Mota!
A plateia se comoveu em risos espontâneos e aplausos calorosos! E Gonzaga Mota saiu dali com sua eleição garantida para deputado federal.
Caro Gamaliel, cumprimento o amigo pelo blog, pelo texto leve, divertido e histórico, e claro, pelos ovos do Governador, sem os quais a referida mãe, provavelmente não teria tido aquela salvável criança!
Querido Arnaldo Santos,ícone do jornalismo cearense, que surpresa agradável ter você entre os meus leitores!
Grande Gamaliel. É sempre uma alegria conhecer meandros de sua atuação. Sua grandeza sempre extravasa em ações de ajuda ao próximo. Meus parabéns! Abs. Neivinha e Gustavo.