Alô, saudade!

Permita-me, o “mestre” Ataulfo Alves, inspirar-me nos lindos versos de sua composição “Boêmio”, característica musical do programa “Alô, Saudade!”, produzido e apresentado por Carvalho Nogueira, durante muitos e inesquecíveis anos na radiofonia cearense.

“Boêmio, nos cabarés da cidade,

buscas a felicidade na tua própria ilusão…”

Carvalho, como a grande maioria dos jovens de sua época, conheceu aquele ambiente, mas não se iludiu que ali estava a sua felicidade. Aprendeu, na escola da vida, que a “a boemia resume, no vinho, o amor e o ciúme, perfume e desilusão”.

E, foi, talvez numa daquelas noites, na abertura do “Alô, Saudade!”, que o pequeno-gigante Carvalho Nogueira meditou sobre a pergunta que o intérprete de sua música preferida fazia a todos os notívagos de Fortaleza:

“- Boêmio, ouça, então, por que é que queres amar a tantas mulheres, se tens um só coração?…”

Naquele momento, o nosso “poetinha cearense” teria dito para si mesmo: “Boêmio, pensa na vida um instante e vê que o amor inconstante só trás por fim solidão”.

E foi, assim, imbuído deste pensamento – a busca da “metade” única e certa – que Carvalho Nogueira se completou, para o resto da vida, com Teresinha Silveira. A cantora romântica chegou na hora exata e passou, então, a encantar, com sua voz e com o seu amor, todos os momentos daquele que, a partir dali, se tornou um “boêmio de pijama” apaixonado.

E aqueles últimos versos da composição de Ataulfo – “Boêmio, tu vives sonhando com a felicidade, mas não és feliz; vive o boêmio sorrindo e cantando, mas o teu sofrer o teu riso não diz” – tornaram-se, graças à Teresinha, coisas de um passado distante na vida de nosso saudoso Carvalho Nogueira.

Na tarde do último sábado, na condição de mestre-de-cerimônias da Assembléia Legislativa, encontrava-me, a serviço, em Limoeiro do Norte, quando recebi a notícia de que o meu querido amigo havia se mudado para o Mundo Maior. Pedi, então, aos que me cercavam:

– Por favor, não me falem na palavra morte, pois pessoas como Carvalho Nogueira, pela sua inteligência, simplicidade e, sobretudo, pelo seu legado cultural, são, sem dúvida alguma, imortais.

E, com certeza, ao ingressar no Andar de Cima, Carvalhinho deve ter se deparado com Ataulfo Alves que, por sua vez, dirigiu-se ao Noel Rosa, Lupícinio Rodrigues, Nelson Gonçalves, Altemar Dutra e a outros não menos famosos integrantes da Comissão de Recepção, constituída especialmente por Deus para receber aquela grande criatura humana, excepcional bom caráter:

– Olha lá, quem chegou, gente: aquele jornalista, poeta, radialista e escritor, lá do Ceará, que tanto divulgou a nossa música!

Mas, Carvalho Nogueira – como que fazendo um daqueles brindes “tim-tim” que eram caracterizados pelo pequeno braço curvado à sua frente – nem atentou para a homenagem, pois ainda estava encerrando o seu último programa, aqui na terra:

– Adeus, Fortaleza, cidade de meus amores… Alô, saudade!


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